Fiança no processo criminal
A notícia da saída do ex-jogador de futebol, Daniel Alves, da prisão, pegou a imprensa espanhola e a brasileira de surpresa. Condenado a mais de 4 anos de reclusão pela justiça da Espanha, em caso de estupro, o ex-jogador teve concedida a liberdade provisória mediante pagamento de fiança. A concessão da liberdade gerou revolta na população espanhola e brasileira, que protestou contra a decisão. Apesar das diferenças entre as legislações dos dois países, procuraremos aqui entender, quais são as bases principiológicas e materiais para o arbitramento de fiança e como ela funciona.
No caso de Daniel Alves, sua defesa entrou com pedido de liberdade provisória na corte de Barcelona, para que ele pudesse responder ao julgamento dos recursos em 2ª estância fora da prisão. No ordenamento jurídico espanhol, a fiança funciona como uma medida cautelar, ela tem a função de impedir ou dificultar a fuga do preso antes do julgamento. Ou seja, é imposto ao réu uma condição financeira adversa, que possui o condão de mitigar as chances do não cumprimento das obrigações judiciais. Esses valores serão devolvidos integralmente ao réu após decisão definitiva, seja ela qual for, se forem cumpridas as demais condições para liberdade provisória.
A fiança para o direito penal brasileiro funciona também como medida cautelar, ela é concedida pelo juiz competente ou em casos excepcionais pelo delegado de polícia. Este instituto é uma garantia constitucional do investigado, assegurada pelo artigo 5º, inciso LXVI, da Carta Magna. Ela está prevista no artigo 319, inciso VIII, do Código Penal, que prevê a aplicação de fiança para: “assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial”.
Cabe mencionar, que além de pretender que o investigado cumpra suas obrigações com os procedimentos legais, outra função da fiança garantir o pagamento das custas, da indenização pelo dano causado com o crime e da multa. O pagamento da fiança poderá ser feito em dinheiro ou por depósito de bens. Nas infrações cuja pena privativa de liberdade, no grau máximo, não for superior a 4 (quatro) anos, o valor da fiança será fixado de 1 (um) a 100 (cem) salários-mínimos; e em caso de a pena privativa de liberdade cominada ser superior a 4 (quatro) anos, de 10 (dez) a 200 (duzentos) salários-mínimos.
Em consonância com os artigos 325 e 350, do Código Penal, temos a possibilidade de o valor da fiança ser aumentado em até 1000 (mil) vezes, levando-se em consideração a natureza da infração, vida pregressa do autor do fato, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo, até final julgamento, e sobretudo a situação econômica do preso.
Insta-se dizer que há no direito brasileiro aqueles crimes que não comportam fiança, os chamados crimes inafiançáveis, são eles: racismo; tortura; tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins; terrorismo; crimes hediondos; e ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. Vê-se que no Brasil, estupro é considerado crime hediondo, portanto não é passível de fiança.
Destarte a repercussão da decisão espanhola, a concessão da liberdade ao ex-jogador foi concedida com base no baixo risco de evasão e no cumprimento de boa parte da pena, segundou fundamentou a corte. Porém é necessário um olhar menos pragmático da legalidade, a liberdade provisória nestes casos pode figurar também como uma forma de afronte a justiça, e de impunidade dos atos cometidos. Já é hora de a justiça proteger de fato as verdadeiras vítimas.
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Escritório: Casarotti Pereira Advogados